domingo, 24 de agosto de 2008

Decréscimo ou desconstrução da economia

Enrique Leff*
Os anos 60 convulsionaram a idéia do progresso. Depois da explosão populacional, soou o alarme ecológico. Foram questionados os pilares ideológicos da civilização ocidental: a supremacia e o direito do homem de explorar a natureza e o mito do crescimento econômico ilimitado. Pela primeira vez, desde que o Ocidente abriu a história da modernidade, guiada pelos ideais da liberdade e do iluminismo da razão, questionou-se o princípio do progresso impulsionado pela potência da ciência e da tecnologia, que logo se converteram nas mais servis e servíveis ferramentas do acúmulo de capital.
A bioeconomia e a economia ecológica propuseram a relação entre o processo econômico e a degradação da natureza, o imperativo de internalizar os custos ecológicos e a necessidade de agregar contrapesos distributivos aos mecanismos do mercado. Em 1972, um estudo do Clube de Roma apontou, pela primeira vez, “Os limites do crescimento”. Dali surgiram as propostas do “crescimento zero” de uma “economia de estado estacionária”.
Quatro décadas depois, a destruição das florestas, a degradação ambiental e a poluição aumentaram de forma vertiginosa, gerando o aquecimento do planeta pelas emissões de gases causadores do efeito estufa e pelas inelutáveis leis da termodinâmica, que desencadearam a morte entrópica do planeta.
Os antídotos produzidos pelo pensamento crítico e a inventiva tecnológica resultaram ser pouco digeríveis pelo sistema econômico. O desenvolvimento sustentável se mostra pouco duradouro, porque não é ecologicamente sustentável! Hoje, diante do fracasso dos esforços para deter o aquecimento global (o Protocolo de Kyoto havia estabelecido a necessidade de reduzir gases causadores do efeito estufa ao nível de 1990), surge novamente a consciência dos limites do crescimento e a chamada ao decrescimento. Embora Lewis Mumford, Ivan Illich e Ernst Schumacher voltem a ser evocados por sua crítica à tecnologia e seu elogio “do pequeno”, o decrescimento se apresenta diante do fracasso do propósito de desmaterializar a produção, o projeto impulsionado pelo Instituto Wuppertal que pretendia reduzir em quatro, e até dez vezes, os insumos da natureza por unidade de produto. Ressurge, assim, o fato indiscutível de que o processo econômico globalizado é insustentável. A ecoeficiência não resolve o problema de um mundo de recursos finitos em perpétuo crescimento, porque a degradação entrópica é irreversível.
A aposta pelo decrescimento não é apenas uma moral crítica e reativa, uma resistência a um poder opressivo, destrutivo, desigual e injusto; não é uma manifestação de crenças, gostos e estilos alternativos de vida; não é um simples decrescimento, mas uma tomada de consciência sobre um processo que se instaurou no coração do mundo moderno, que atenta contra a vida do planeta e a qualidade da vida humana. O chamado para decrescer não deve ser um simples recurso retórico para dar vôo à critica do modelo econômico imperante.
Deter o crescimento dos países mais opulentos, mas continuar estimulando o dos mais pobres ou menos “desenvolvidos” é uma saída falsa. Os gigantes da Ásia despertaram para a modernidade; apenas China e Índia estão alcançando e ultrapassando as emissões de gases causadores do efeito estufa produzidas pelos Estados Unidos. A eles se somariam os efeitos conjugados dos países de menor grau de desenvolvimento levados pela racionalidade econômica hegemônica.
Decrescer não implica apenas em desacelerar ou se desvincular da economia. Não equivale a desmaterializar a produção, porque isso não evitaria que a economia em crescimento continuasse consumindo e transformando natureza até ultrapassar os limites de sustentabilidade.
A abstinência e a frugalidade de alguns consumidores responsáveis não desativam a mania de crescimento instaurada na raiz e na alma da racionalidade econômica, que contém um impulso ao acúmulo do capital, às economias de escala, à aglomeração urbana, à globalização do mercado e à concentração da riqueza. Saltar do trem andando não conduz diretamente a desandar o caminho.
Para decrescer não basta baixar da roda da fortuna da economia. As excrescência do crescimento, o pus que brota da pele gangrenada da Terra, ao ser drenada a seiva da vida pela esclerose do conhecimento e a reclusão do pensamento, não se retroalimenta no corpo enfermo do planeta. Não se trata de reabsorver seus dejetos, mas de extirpar o tumor maligno. A cirrose que corrói a economia não será curada com a injeção de mais álcool na máquina de combustão dos carros, das indústrias e dos lares. Além da rejeição à mercantilização da natureza, é preciso desconstruir a economia realmente existente e construir outra economia, baseada em uma racionalidade ambiental.
* O autor é ambientalista, escritor e ex-coordenador da Rede de Formação Ambiental para a América Latina e o Caribe do Pnuma.
Direitos exclusivos do Terramérica.
Crédito de imagem: Fabrício Vanden Broeck Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.
(Envolverde/Terramérica)

Ferramenta para análises urbanas

Thiago Romero, da Agência Fapesp
A versão final de um software livre de informações geográficas, que acaba de ser lançado, poderá dar aos gestores públicos de muitas cidades brasileiras uma ferramenta computacional adaptada às suas necessidades para o planejamento de políticas em áreas como educação e saúde.
Trata-se do TerraView Políticas Sociais, um programa de geoprocessamento para análises e interpretações espaciais da realidade social de áreas urbanas, desenvolvido pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) da FAPESP, em parceria com a Divisão de Processamento de Imagens (DPI) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O aplicativo, que é de uso livre e pode ser baixado gratuitamente pela internet, permite ao usuário realizar diagnósticos e equacionamentos de diferentes questões sociais, econômicas e demográficas. O objetivo é dar suporte a pesquisadores e gestores públicos que atuam em áreas como educação, saúde, transferência de renda e habitação.
"O software supre um dos objetivos do CEM, que é a adaptação e transferência, para um público cada vez mais amplo e diversificado, de inovações tecnológicas voltadas para a análise de políticas públicas", disse Sandra Gomes, responsável pelo desenvolvimento do software no CEM, à Agência FAPESP. Segundo ela, o georreferenciamento é uma ferramenta útil para subsidiar o planejamento das políticas em grandes cidades, principalmente as de educação e saúde. "Os softwares semelhantes disponíveis no mercado, entretanto, custam a partir de US$ 1,5 mil para uso em apenas um computador. A partir de agora, temos um software gratuito com uma interface mais amigável, fácil de usar e que faz análises sofisticadas e objetivas", afirma a também coordenadora da Área de Transferência de Tecnologias do CEM. Sandra ressalta que o software é também acessível a usuários não-especializados em informática ou geoprocessamento e dá um exemplo de utilização da nova ferramenta: por gestores de uma prefeitura ou secretaria municipal que queiram descobrir as áreas com maior demanda para a construção de uma nova escola.
"Um dos critérios para isso é, obviamente, identificar os locais com muitas crianças e poucos equipamentos de ensino. Com o geoprocessamento inserimos diferentes tipos de indicadores em um mapa a fim de cruzar os dados para formar várias camadas sobrepostas de informações", explicou Sandra. Nesse caso podem ser usados dados de população dos setores censitários do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que seriam cruzados com informações de uma área específica de planejamento da Secretaria de Educação local, por exemplo, possibilitando a identificação do número de vagas e de alunos sendo atendidos em determinada região. "Com uma conta simples, os gestores conseguem saber onde há locais com muitas crianças e poucas escolas, definindo qual é a demanda regional que passa a se tornar prioritária para a construção de uma nova estrutura escolar", disse.
O programa voltado a políticas sociais consiste em uma adaptação das funcionalidades do TerraView, software desenvolvido no Programa Espaço e Sociedade, uma iniciativa do Inpe para aproximar as inovações derivadas do Programa Espacial Brasileiro às necessidades de ferramentas voltadas para a elaboração de políticas públicas sociais no país. Capacitação para uso do software Com o objetivo de facilitar o uso do TerraView Política Social, o CEM está oferecendo um curso de geoprocessamento para que os participantes aprendam a usar suas ferramentas básicas e sejam habilitados a explorar as bases de dados e a gerar mapas e gráficos com qualidade cartográfica.
Com carga horária de 20 horas, o curso é realizado todos os meses e é dirigido a gestores públicos das áreas sociais, líderes de movimentos urbanos, alunos de graduação e pós-graduação e analistas em geral interessados em produzir interpretações espaciais a respeito da realidade social de áreas urbanas. "A idéia é treinar o maior número possível de pessoas para que esses indivíduos também possam repassar os conhecimentos a outros gestores de suas secretarias regionais e prefeituras", disse Sandra. Os participantes recebem uma apostila com as aplicações do software usadas pelos professores durante as aulas e certificado de conclusão de curso. As duas próximas edições do curso, que oferece uma visão geral do sistema tanto do ponto de vista conceitual como do prático, serão realizadas nos dias 27, 28 e 29 de agosto e nos dias 24, 25 e 26 de setembro.
Mais informações sobre o curso: www.centrodametropole.org.br/t_transf_cursos.htmlPara conhecer e fazer o download do TerraView Política Social, clique aqui.
(Agência Fapesp)

Água pode ser o motivo de uma próxima crise mundial

Paula Scheidt, do CarbonoBrasil
Se hoje os altos preços do barril de petróleo e dos alimentos andam dando dor de cabeça para muita gente, em breve a preocupação deverá ser com o custo da água. Com o crescimento populacional e a falta de condições sanitárias adequadas principalmente nos países em desenvolvimento, uma Crise Mundial da Água pode estar eminente, segundo alguns especialistas e, um mercado mundial de água potável já é visto como um caminho para minimizar as perdas.
“Por trás da crise alimentar está uma crise global por água potável, com expectativas de se tornar ainda pior com a intensificação dos impactos das mudanças climáticas”, disse o diretor geral da WWF, James Leape, que falará nesta terça-feira (19) na Semana Mundial da Água, evento que reúne, em Estocolmo, 2,5 mil especialistas em água de todo o mundo. Cerca de 1,4 bilhões de pessoas vivem hoje em áreas que dependem de bacias hidrográficas que estão secando e outros um bilhão de indivíduos já sofrem com a falta de água potável para beber, o que diminui a expectativa de vida ou causa problemas de desenvolvimento imprevisíveis. O evento foi aberto oficialmente nesta segunda-feira (18/8), com o pronunciamento do professor britânico Anthony John Allan, que recebeu o Prêmio da Água de Estocolmo 2008. Durante estudos sobre a falta de água no Oriente Médio, o professor Allan, da Universidade King’s College de Londres (UK), desenvolveu o conceito “água virtual”, que seria o volume de água potável usada para produzir um produto, medida no lugar onde o produto foi realmente fabricado.
Através desta concepção, o problema da água passa para o campo político e pode cair no comércio internacional. Allan sugere a utilização da importação virtual da água, através dos produtos e alimentos, como uma alternativa de “fonte” de água potável para reduzir a pressão sobre bacias hidrográficas disponíveis em países que já lidam com a escassez. Na palestra "Conhecendo a água e entendendo porque nós a usamos e consumimos deste modo" , proferida ontem, o professor Allan alertou para os padrões de consumo de água dos países do hemisfério norte, que desperdiçam água através do consumo de alimentos e poluição, e das nações do sul, onde é preciso melhorar a eficiência no uso da irrigação do solo.
"A água virtual é, evidentemente, uma questão muito política”, afirmou, destacando que, ambos, a água virtual e sua migração, são invisíveis e a sociedade precisa ter consciência deste processo para que sejam obtidos avanços com relação ao modo como a água é consumida. Países como Estados Unidos, Argentina e Brasil “exportam” bilhões de litros de água por ano, segundo Allan; enquanto outros como Japão, Egito e Itália importam bilhões.
Allan sugere que os produtos que necessitam uma maior quantidade de água sejam importados de países que possuem mais disponibilidade hídrica. Comércio de água Assim como para o clima, o mercado já desenvolveu também ferramentas para lidar com a questão da poluição da água, como nos Estados Unidos, onde em 2003 foi criado um comércio voluntário de créditos de redução de poluição.
Neste sistema, uma indústria ou empresa que tem um alto custo para controlar a poluição que produz pode comprar créditos de redução de poluição de outras que tenham um custo mais baixo para reduzi-la, diminuindo assim os custos para cumprir as obrigações ambientais.
A China também já experimenta a criação de um mercado de água para aliviar as diferenças de disponibilidade dentro do seu território. Em fevereiro deste ano, o país criou um esquema de alocação de direitos sobre a água de províncias, regiões autônomas e municípios que estejam diretamente sob a jurisdição do governo central. “Enquanto a demanda por água se mantém alta, os resíduos líquidos se mantém perversos devido ao ‘livre acesso’ a recursos hídricos atualmente na China”, ressalta o gerente do programa chinês da ong Worldwatch Institute, Yingling Liu. Ele explica que, de acordo com as estatísticas, o coeficiente de utilização do país para irrigação agrícola era de apenas 0,4 a 0,5 em 2003, comparado a 0,7 a 0,8 dos países industriais.
O uso de água por unidade do produto interno bruto estava em 413 metros cúbicos, quatro vezes a média mundial, enquanto que o uso de água por valor adicionado pela indústria era de 218 metros cúbicos, 5 a 10 vezes o nível de países industriais. Em 2000, o país teve uma primeira experiência de comércio de água, quando a cidade de Dongyang comprou 50 milhões de metros cúbicos de água anualmente de Yiwu, por US$ 0,57 por metro cúbico. Até 2005, ambos os lados foram beneficiados, até que uma forte seca atingiu Yiwu.
A cidade evitou os custos significativos de ter que construir um reservatório próprio porque Dongyang passou a receber fundo para manter um reservatório existente. Desde então o país lançou diversos testes em iniciativas locais para aliviar crises de água ou esforços do governo para promover economia. Segundo Liu, isto deu confiança para que os politicos exploraressem um esquema nacional, resultando nas regulamentações recentes. “Se tornar-se efetivamente lei, poderá ser tão significativa quanto a reforma de terra largamente adotada nos anos 50, que liberou os trabalhadores rurais e tornou possível alimentar a nação de 1,3 bilhões de pessoas. Apesar de muito trabalho ainda ser necessário, uma regulamentação é um grande passo em direção ao gerenciamento hídrico na China”, disse.
(Envolverde/Carbono Brasil)

"Prédios verdes precisam de incentivos e de consciência"

Fátima Cardoso, para o Instituto Ethos

O Conselho Americano de Construção Sustentável (ou USGBC, na sigla em inglês) desenvolveu vários critérios para verificar se as construções são ou não sustentáveis. Desde o ano 2000, esses critérios se materializaram na LEED - abreviação em inglês de liderança em energia e projeto ambiental -, uma certificação independente que comprova se um prédio é verde. Isso significa, entre outros atributos, que aquele prédio gasta menos água e energia, produz menos lixo, emite menos poluentes ou gases de efeito estufa e é um ambiente mais saudável para seus ocupantes. A certificação LEED pode ser empregada em vários tipos de construção, como prédios novos ou antigos, escolas, lojas comerciais e casas, e seus critérios estão sendo adaptados para os prédios brasileiros por uma comissão do Green Building Council Brasil. Até hoje, apenas duas construções brasileiras receberam a certificação LEED. Uma delas é uma agência do Banco Real em Cotia, na Grande São Paulo, e a outra é uma filial do laboratório Delboni Auriemo inaugurada há poucos meses no bairro de Santana, em São Paulo. Tom Hicks, vice-presidente do LEED para o Desenvolvimento da Vizinhança e responsável pelo sistema de avaliação da LEED em todo o mundo, esteve no Brasil para falar da versão 2009 da certificação. Nesta entrevista, ele analisa os principais obstáculos para que os prédios verdes se tornem cada vez mais comuns e cobra com veemência uma atuação mais forte das empresas na direção da sustentabilidade.

Instituto Ethos: Construções verdes não são muito mais caras do que as tradicionais. No Brasil, calcula-se que o custo desse tipo de construção seja até 15% maior. Mas, no longo prazo, é mais barato manter esses prédios, e eles têm menor impacto no meio ambiente. Por que todos os novos prédios não são verdes?

Tom Hicks: É uma boa pergunta. E, só para colocar em uma perspectiva diferente, nos Estados Unidos os prédios verdes são zero por cento mais caros. Mas, de volta à questão: por que não há mais prédios verdes? Acho que isso em parte tem a ver com consciência. E em parte é porque as indústrias de projetos e de construção são muito conservadoras e estão acostumadas a fazer as coisas de uma determinada maneira. Os prédios verdes desafiam a maneira como você projeta e constrói edifícios. Para projetar o melhor prédio, é necessário um processo integrado. E não é só a integração entre os arquitetos e os engenheiros, ela envolve o dono do prédio, que vai ocupá-lo depois de pronto, desde o começo. Ele deve dar sua opinião desde o início do processo, de forma que o prédio que é entregue atenda ao que foi pedido. Isso parece simples, é claro que um prédio deveria funcionar como foi planejado, mas o que se vê é que um prédio tradicional, seis meses ou um ano depois da ocupação, não funciona da maneira planejada. Há um nome para esse período - o shakeout period (fase de ajustes), no qual você aprende como gerenciar o prédio. Então, acho que parte dessa resposta é quebrar algumas das antigas barreiras sobre como você projeta os prédios. E, num grau mais amplo, acho que é uma questão de consciência. Mas, isso está se tornando um problema cada vez menor, as pessoas estão cada vez mais habituadas às vantagens dos prédios verdes. E há aqueles que, honestamente, não vão mudar até que vejam a certeza absoluta. São as mesmas pessoas que questionam as mudanças climáticas. São os que dizem "bem, não vou fazer isso porque não tenho certeza dos resultados, quero ver mais dados". Se você é essa pessoa, será o último a construir prédios verdes. E você não vai usufruir dos benefícios que poderia se estivesse em um prédio verde.

IE: Como superar esses obstáculos?

TH: Há um grande papel a ser feito pelos governos que é o de liderar pelo exemplo. Eles poderiam estar construindo seus próprios prédios verdes. Mas, também, poderiam começar a estabelecer padrões para o mercado. Há vários padrões muito eficientes que podem ser estabelecidos, seja no nível estadual ou no de governos locais. Eles podem fazer coisas fáceis, como isenção de impostos, algo que fazemos nos Estados Unidos o tempo todo. Esse é um caminho. Outro caminho que eu acho interessante para certos setores é o que se chama de "permissões expressas". Todo construtor precisa de uma permissão para construir um prédio, e todas elas vão para uma fila. Mas, se você se comprometer a adotar os critérios da LEED, você vai para o começo da fila, e assim ganha muitos meses. Se você está no ramo do varejo, ou se está construindo hotéis, é uma enorme vantagem estar pronto para começar a trabalhar seis meses antes do que estaria se tivesse construído de outra forma. Outra área que estamos começando a ver em algumas partes do mundo é o que se chama de densidade de construção. Se um projeto se compromete com os critérios LEED, recebe permissão para construir em uma área maior do que poderia. O raciocínio é que esse prédio tem um impacto ambiental menor do que um prédio tradicional. Essas são as áreas em que se pode atuar para superar os obstáculos. E acho que vamos criar cada vez mais consciência sobre o que fazemos.

IE: Ainda estamos longe de ver mais avanços nessa área?

TH: Atualmente, estamos chegando perto do tipping point (ponto de mudança), em que as pessoas vão olhar em volta e perceber que são os últimos que ainda estão fazendo construções tradicionais, enquanto todos os outros estão construindo prédios verdes. Já estamos vendo essas forças competitivas atuando. Uma empresa não quer ser a última a fazer algo, e as outras já estão vendo os prédios verdes como uma vantagem competitiva. Há dados surgindo nos Estados Unidos mostrando que os prédios valem muito mais se forem uma construção verde. Em alguns mercados, no aluguel de uma propriedade, há um prêmio associado ao fato de ser um prédio verde, e os verdes têm uma taxa de ocupação maior do que prédios tradicionais.

IE: Qual a responsabilidade das empresas para impulsionar o mercado das construções verdes, seja ao construir lojas ou alugar escritórios? Até que ponto as empresas podem contribuir com essa mudança?

TH: Tenho uma visão muito específica em relação a isso. Uma visão muito tendenciosa. Para mim, isso é parte da responsabilidade fiduciária das empresas, para usar um termo da linguagem delas. É parte da responsabilidade fiduciária das empresas fazer todas suas operações de maneira tão sustentável quanto possível. No fim das contas, se você não for tão sustentável quanto pode ser, nem tão eficiente quanto você pode ser, isso significa que seus competidores são. Acho que meio ambiente é uma área em que externalizamos os custos por um tempo longo demais. Agora, precisamos realmente internalizar esses custos. Nos Estados Unidos, há empresas que, no passado, jogavam esgoto em rios - e fizeram isso sem punição por anos e anos. Só que isso tem um custo, e nos Estados Unidos as pessoas que pagam impostos são as que estão pagando por esses custos. Felizmente, criamos leis para recolocar esses custos nas empresas. Mas, é um processo difícil. Toda empresa deveria estar procurando maneiras de evitar a externalização de seus custos ambientais. Para mim, é parte da sua responsabilidade fiduciária que elas sejam sustentáveis.

IE: O que a certificação LEED garante em relação a um prédio?

TH: Garante que aquele prédio passou por uma certificação independente e demonstra que atendeu a padrões de construção verde. Isso é importante, porque no passado, antes da existência da LEED ou de outras certificações, qualquer um podia dizer que era verde. Colocavam painéis solares, por exemplo, e diziam que eram verdes. Bem, uma construção verde é muito mais do que isso. Pode incluir esses elementos, mas a definição do USGBC para prédios verdes não é relacionada apenas a alguns elementos ou ao desempenho do prédio, mas também leva em consideração os processos de construção. Acho que essa não é uma resposta sobre o que a certificação LEED é, essa é mais uma questão sobre o que não é: não é greenwashing (maquiagem verde). Alguém diz "eu fiz isto" e a certificação mostra que essa organização atendeu a esses padrões. Há alguns que dizem: "vou fazer essa lista de coisas exigidas pela LEED, mas não vou submeter o prédio à certificação". Bem, minha resposta a isso é que você sempre tira notas melhores na prova quando você mesmo a corrige. Parte do DNA do LEED é ser uma certificação independente. A LEED diz: "nós verificamos, e você realmente fez isso".
(Envolverde/Instituto Ethos)

domingo, 17 de agosto de 2008

Cidades passam de vilãs para heroínas da crise ambiental

A disputa entre preservação ambiental e construção sempre foi um campo de acaloradas discussões, porém se antes as cidades eram vistas como uma das causas da degradação, hoje parecem ser a solução. A concentração de pessoas reduz o consumo de recursos naturais, mantém vastas áreas ricas em biodiversidade livre da interferência humana e cria um solo fértil para inovações. “As cidades desenhadas corretamente são a solução. E de qualquer maneira este é o padrão.
Em todos os países em desenvolvimento, você tem um movimento muito significativo das pessoas indo do campo para as cidades”, afirma o arquiteto chinês Chien Chung Pei, famoso pela construção de torres arranha-céu, museus pós-modernos e a pirâmide do Museu de Louvre, em Paris. Pei ressalta, no entanto, que a intervenção de arquitetos, urbanistas, engenheiro e todos responsáveis pelo desenho urbano deve ser feita de forma cuidadosa, para que cidades se mantenham habitáveis para um número crescente de pessoas.
A cada semana, as áreas urbanas de todo o mundo recebem um milhão de novos indivíduos. “Nós precisamos trabalhar para diminuir a lacuna entre o muito rico e o muito pobre, sem tirar o incentivo para criar. A humanidade se torna melhor porque criamos coisas novas, nós inventamos, fazemos arte, escrevemos novos livros. Este é o nosso impulso”, diz Pei. Para o brasileiro Oliver Hillel, coordenador do Programa de Biodiversidade e Cidades da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) da Organização das Nações Unidas, a melhor maneira de poupar o meio ambiente é criar uma ocupação mais intensiva e menos extensiva. “O crescimento vai ocorrer de qualquer jeito, não precisa ser incentivado. O que precisamos incentivar é a formação e o desenvolvimento correto das cidades, de forma que a biodiversidade já esteja incorporada no próprio design, no próprio planejamento urbano”, disse ao jornal
O Estado de São Paulo em uma entrevista recente. O arquiteto argentino Máximo Rumis, especialistas em design urbano, alerta que a combinação do consumo atual de recursos, o aumento populacional e os danos ambientais têm trazido conseqüências nefastas para algumas civilizações e as cidades são parte importante desta crise. “Temos algum tempo para reverter certas questões.
O aquecimento global, por exemplo, está mexendo com o mundo e pode levar a catástrofes inesperadas. Cerca de 48% das emissões de dióxido de carbono (CO2) dos EUA vem das edificações”, afirma. Modelo de urbanização norte-americano Rumis descreve os modelos de desenvolvimento de cidades americanas baseada nos subúrbios residenciais, por exemplo, como um dos grandes problemas.
O consumo energético em cidades como Houston e Detroit é 15 vezes maior que o de Hong Kong, principalmente devido ao tipo de transporte utilizado, o automóvel. O padrão de urbanização dos EUA é, segundo Rumis, é baseado em divisão de setores econômicos, shoppings centers com grandes estacionamentos, torres de office parks altas, escolas afastadas onde só se chega com carros e grandes autopistas que “dissecam a vida em sociedade”. “Estas cidades são amebas: pontos separados de atividades unidos por uma grelha. Uma mãe norte-americana passa 17 dias completos atrás do volante só para transportar o filho”, comenta Rumis. Para o arquiteto e urbanista, a cidade do futuro irá juntar todas as atividades que necessitamos em um só lugar. “Será compacta, densa, central, diversa, com usos mistos e ambientes que incentivem a caminhada”, descreve.
Contudo, o arquiteto Rubén Pesci, diretor da UNESCO para desenvolvimento sustentável, lembra que é preciso reciclar as cidades antigas antes de construir novas. “É a cidade real que temos que transformar, não criar condomínios novos. Temos que fazer grande, não pequeno”, afirma, criticando projetos de novo urbanismo que propõe criar bairros que são uma espécie de mini-cidades, pois atendem todas as necessidades dos moradores.
Leia também as entrevistas exclusivas com o arquiteto Chien Chung Pei e com o engenheiro Thomas Gierlevsen, especializado na construção de ilhas artificiais.
Oriente médio e os desafios pós-petróleo – Thomas Gierlevsen
Sustentabilidade na arquitetura pós-moderna – Chien Chung Pei
(CarbonoBrasil)

O exemplo da França: usar o mercado para melhorar a eficiência dos automóveis

Por Luiz Carlos Porto*
Em pleno Século 21, um automóvel médio desperdiça cerca de 99% da energia consumida, ou seja, do combustível adicionado apenas 1% é efetivamente usado mover um motorista. Apesar de todo aspecto moderno, o automóvel é um dos equipamentos menos eficientes que existem. De fato, a concepção do motor à combustão interna é a mesma do primeiro automóvel, fabricado há mais de 120 anos.
É difícil de acreditar, mas em pleno Século 21, um automóvel médio desperdiça cerca de 99% da energia consumida, ou seja, do combustível adicionado apenas 1% é efetivamente usado para mover um motorista. Mas como isso ocorre? Apenas 1/8 da energia consumida chega às rodas do veículo. O resto é perdido no aquecimento do motor, transmissão, acessórios e quando o automóvel está parado com o motor ligado. E desse 1/8 metade se perde no aquecimento dos pneus e no deslocamento de ar. Portanto, somente cerca de 6% da energia gasta efetivamente acelera o veículo.
Todavia, 95% da massa a ser acelerada é o carro e não o motorista. Assim, apenas cerca de 1% do combustível é usado para movimentar um motorista. É como se de cada R$ 100,00 que colocamos de combustível R$ 99,00 fossem para o lixo. Enquanto o projeto do automóvel não for alterado para reduzir essa imensa ineficiência, através de novas concepções de motores (híbridos, elétricos, à célula de hidrogênio), de melhor aerodinâmica e de materiais mais leves (compostos de carbono, etc.), não há sentido em se falar em combustíveis renováveis, como o etanol. Será só trocar um problema por outro: o excessivo consumo de petróleo pelo excessivo consumo de terra para produzir etanol. Felizmente, algumas ações estão sendo tomadas para romper com essa ineficiência.
Recentemente, a França tomou uma medida importantíssima para incentivar o mercado a produzir veículos mais eficientes e menos poluentes. Os automóveis à venda no país foram classificados de acordo com sua emissão de Gases de Efeito Estufa. Em janeiro de 2008 entrou em vigor uma Lei que impõe um imposto de até 2.600 euros para quem comprar os automóveis mais poluentes.
A mesma Lei dá um bônus de até 1.000 euros para quem comprar os automóveis menos poluentes. Essa legislação dá um grande incentivo econômico para a produção de veículos mais eficientes, fazendo o próprio mercado trabalhar no caminho certo. Nos primeiros quatro meses de vigência da Lei houve um aumento de 43% na venda dos veículos classificados como menos poluentes. Tomara que esse tipo de imposto ecológico se espalhe mundo afora, e que chegue logo ao Brasil. * Luiz Carlos Porto é engenheiro e diretor técnico da Silva Porto Consultoria Ambiental.
(Instituto Akatu)

Luz para Todos deve ampliar meta em 50%

Osmar Soares de Campos, para Pnud
Em novembro de 2003, o governo federal estabeleceu uma meta para, em cinco anos, erradicar o que chamou de "exclusão elétrica" em todo Brasil: levar a eletricidade para 2 milhões de residências no meio rural, beneficiando 10 milhões de pessoas. A poucos meses de vencer o prazo e de cumprir o que propôs, o Luz para Todos, como foi batizado o programa, se vê obrigado a ampliar tal meta para poder cumprir o objetivo inicial, uma vez que o universo de pessoas sem energia elétrica era maior do que se imaginava. Neste ano, um decreto do presidente Lula aumentou o prazo de execução do Luz para Todos de 2008 para 2010, ano em que, aproximadamente, 1 milhão de residências além das previstas inicialmente pelo programa devem ter acesso à fonte básica de energia doméstica. Se confirmado esse número — ainda não consolidado pelo governo —, o projeto de levar eletricidade para as regiões remotas do país terá um incremento de 50% sobre o que foi inicialmente planejado, passando para 3 milhões de lares. No total, 15 milhões de pessoas devem ser beneficiadas.
"A meta original tomava como base levantamentos que se tinha conhecimento à época e universalizaria o atendimento no meio rural (...). Com o andar do programa, foi-se observando que novas demandas surgiram. Vamos cumprir a meta de 2 milhões este ano, mas existe uma demanda adicional, que levou o programa a ser prorrogado até 2010 ", afirma o arquitato Aurélio Pavão de Farias, responsável Coordenação da Região Norte do Luz para Todos. Para cumprir o objetivo estipulado em 2003, o Luz para Todos precisa ainda chegar a mais 380 mil famílias neste ano — ocorreram, nos sete primeiros meses, 175 mil ligações. Hoje, pouco mais de 1,6 milhão de famílias foram atendidas, algo em torno de 8 milhões de pessoas (o país adota cinco integrantes como média para uma família). "Nós estamos fazendo uma série de ações e vamos cumprir este ano a meta de dois milhões de famílias atendidas", promete Farias. A maior parte das ligações que ocorreram até o momento foi de extensão de rede, ou seja, levaram, por meio de cabos, a energia de redes que já existiam para o campo. "Nós procuramos chegar primeiro a quem dispunha de melhores condições", diz Farias. "Há algumas situações de comunidades isoladas, mais para dentro da Amazônia, no Nordeste e no Sul, mas representa muito pouco, por enquanto.
Vamos atender o grosso das famílias mais isoladas nessa nova fase por meio de outras soluções, até por conta do custo de levar energia a elas", acrescenta. "Cada situação merece um projeto específico para elevar o potencial, não só energético, mas também o potencial produtivo das comunidades. Energia solar é uma das alternativas, mas nós temos a biomassa [que usa bagaço de cana ou restos de madeira, por exemplo], baixas quedas d’água… O biodiesel é outra possibilidade", lembra Farias. Estimativas do Luz para Todos apontam que a exclusão elétrica, nessa primeira fase do projeto, estava concentrada na região Nordeste (54%), seguida por Norte (22%) Sudeste (12%), Centro-Oeste (7%) e Sul (5%). Resultados Uma pesquisa realizada pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) em 2006, sob a coordenação do Ministério de Minas e Energia, entrevistou 6.543 famílias atendidas pelo programa e revelou que houve um aumento considerável na aquisição de eletrodomésticos nas regiões onde chegou o Luz para Todos. O número de televisores adquiridos, por exemplo, aumentou 44,1%, o que significou a comercialização de mais de 700 mil unidades. Entre os entrevistados, 23,1% afirmaram que pelo menos um dos familiares deixaria o campo caso não tivessem acesso à eletricidade. Levando em consideração o atendimento total de 1,6 milhão de domicílios já realizados no país, esse percentual significa que mais de 370 mil pessoas podem ter permanecido na zona rural por causa das perspectivas oferecidas. Além disso, as obras do Luz para Todos geraram 241 mil empregos diretos e indiretos, de acordo com o programa. Até agora, foram utilizados 569 mil transformadores, 3,7 milhões de postes e 709 mil km de cabos — o equivalente a mais de 17 voltas ao redor da Terra.
O programa tem como incremento as Ações Integradas do projeto Luz para Todos, que contaram com uma parceria entre o PNUD (parceiro no projeto), a USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional) e o Ministério de Minas e Energia.
(Pnud)