Cibelle Bouças
O aprofundamento da crise financeira internacional preocupa organizações não-governamentais e fundações, que dependem de doações de empresas e órgãos internacionais para desenvolver seus projetos de responsabilidade socioambiental. O Instituto Ethos tem para 2009 orçamento 30% menor que o obtido no ano passado, situando-se entre R$ 10 milhões e R$ 11 milhões. "É absolutamente natural que haja redução nos orçamentos em todas as áreas. O problema é a natureza do corte. Você põe o seu recurso onde põe a sua palavra", afirma o presidente do Instituto Ethos, Ricardo Young.
Para o executivo, muitas empresas reduzirão os recursos concedidos ao terceiro setor proporcionalmente à redução em suas margens de lucro. Mas há também empresas que usam a crise como justificativa para cortar gastos ou demitir. "A crise vai revelar quais empresários estão realmente comprometidos com a responsabilidade socioambiental", afirma Young.
A Fundação SOS Mata Atlântica, fundada em 1986 para promover a preservação das áreas remanescentes da Mata Atlântica, também passa por situação semelhante. A diretora de gestão do conhecimento da entidade, Márcia Hirota, estima redução no orçamento de 7,2%, passando de R$ 19,4 milhões para R$ 18 milhões neste ano. A fundação trabalha com doações fixas de 36 empresas, sendo duas fundos internacionais e uma ONG internacional. A parcela mais importante de recursos, porém, vem de pessoas físicas, que possuem o cartão Bradesco Visa ou adquirem títulos de capitalização Pé Quente.
"Temos mantido em torno de 200 mil contribuintes pessoas físicas, mas já tivemos 250 mil. Não sei como será o reflexo da crise sobre essas contribuições no ano que vem", afirmou. Em relação às empresas-parceiras, Márcia Hirota ainda não prevê redução no número de colaboradores. "Não tivemos nenhuma mudança drástica. As empresas já têm a causa ambiental interiorizada em sua política de gestão. O que pode ocorrer é a empresa fazer mais ou menos ações pontuais de acordo com o seu fluxo de caixa", diz a diretora.
A Associação Brasileira de Ongs (Abong) realizou no fim do ano passado um levantamento entre 32 entidades filiadas para ter um diagnóstico mais preciso da crise. Do total, 24 responderam e 17 delas informaram apresentar algum tipo de déficit orçamentário. Das organizações com problemas financeiros, 71% possuem até duas fontes de financiamento. "A maioria dessas organizações tem como principal fonte de financiamento recursos advindos de órgãos de cooperação internacional, que com a crise reduziram drasticamente a destinação de recursos para todo o mundo e especialmente para o Brasil", afirma a diretora da Abong Tatiana Dahmer.
A rede de cooperação internacional surgiu após a Segunda Grande Guerra e é formada por fundos públicos e privados, focados em ações para erradicar a pobreza em países atingidos pela guerra ou em situação de risco social. De acordo com Tatiana Dahmer, as ONGs brasileiras têm acessado mais recursos públicos e privados recentemente, mas ainda continuam extremamente dependentes de recursos internacionais. "Os recursos internacionais têm se restringido drasticamente. A rede de cooperação reduziu o recurso disponível e tem preferido disponibiliza-lo a países em condições mais precárias, como os da África."
A oferta de recursos do setor privado também está mais escasso, garante o secretário-geral do Grupo de Instituições, Fundações e Empresas (Gife), Fernando Rossetti. O Gife reúne as 116 entidades de maior orçamento do país, que juntas, tiveram em 2007 um orçamento próximo a R$ 1,15 bilhão. Dentre as entidades, 80% são corporativas, como Fundação Vale, Fundação Bradesco, Fundação Kellog e as outras 20% são instituições independentes ou familiares. O Gife não tem projeções de orçamento para 2009. "Certamente haverá um enxugamento do orçamento, linear à redução de receita das empresas, que será maior ou menor dependendo de como a crise irá se desenvolver", afirma.
De acordo com Rossetti, a perspectiva de orçamento mais enxuto tem levado as entidades a reforçar alianças e parcerias. E tem estimulado, ainda, a diversificação das atividades. "As organizações mais estruturadas estão ampliando o portfólio com a venda de produtos, consultorias e prestação de serviços", diz.
Márcia Hirota, da SOS Mata Atlântica, afirma que a ONG já está adotando medidas para economizar água e energia elétrica e está buscando parcerias para a realização de projetos de preservação da Mata Atlântica. "Estamos procurando otimizar os recursos para dar continuidade aos projetos já iniciados", afirma. Ricardo Young, do Instituto Ethos, também reavalia os custos. "Cada projeto tem um orçamento. Aqueles que não tenham cobertura financeira vamos cancelar ou postergar. Os que não tiverem captação de recursos serão desativados. Nossa prioridade é a manutenção do capital humano", afirma. A entidade mantém 55 funcionários em São Paulo.
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