Por Marina Silva
No dia 24 de dezembro, o Ministério de Minas e Energia publicou portaria no "Diário Oficial", abrindo para consulta pública o Plano Decenal de Expansão de Energia 2008-2017. A realização de consulta pública é um avanço, tendo em vista o padrão histórico de relação do setor elétrico brasileiro com a sociedade. Mas o período de festas de final de ano e o prazo exíguo de 30 dias, em plena temporada de férias, não parecem estimular interessados a ler um documento de 766 páginas e encaminhar suas contribuições.
Definitivamente, não é o caminho razoável para estabelecer uma discussão madura e construtiva sobre nossa matriz energética. E há muito o que discutir. Por exemplo, o capítulo sobre análise socioambiental do sistema elétrico demonstraria, em princípio, aceitação de critérios ambientais no planejamento setorial, o que é fundamental para dar curso a uma política ambiental integrada. Um olhar mais atento, porém, mostra situação bem mais complicada.
Segundo o documento, essa análise foi feita a partir de reuniões "com agentes setoriais, públicos e privados". Seria ótimo se esse universo não se resumisse a 16 empresas, grande parte estatais, e cerca de 50 profissionais. Nenhuma universidade é citada, nem pesquisadores independentes ou entidades da sociedade civil. Muito pouco para um país de mais de 180 milhões de habitantes e uma sociedade ativa e participativa. Outro aspecto polêmico está na projeção da capacidade instalada de geração de energia elétrica para 2017, por fonte.
O maior crescimento, de cinco vezes nos próximos dez anos, será o das usinas térmicas a óleo combustível e óleo diesel, o que contradiz o Plano Nacional de Mudanças Climáticas e o anúncio recente, na Conferência de Mudanças Climáticas da Polônia, de metas internas de redução de emissão de gases de efeito estufa.
Enquanto isso, a energia eólica -que, segundo o Atlas do Potencial Eólico Brasileiro, tem potencial de gerar 143,5 GW-, somada à biomassa (sobretudo resíduos da produção de etanol), tem expansão prevista de 5 GW, menos que 10% da energia adicional a ser gerada pelo sistema e no máximo 3,5% de sua capacidade.
Talvez o setor elétrico tenha os seus motivos. O problema é que a sociedade não os conhece e nem conhecerá, nessa consulta a toque de caixa. O MME não deveria deixar no ar essa sensação de consulta pública "pró-forma", como falso presente de Natal destinado a legitimar um plano decenal que ainda precisa ser devidamente desembrulhado e retirado da embalagem para entendermos melhor suas engrenagens e seu funcionamento.
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